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Dor, sofrimento, angústia e, o pior de tudo, a espera. São cerca de 90 pessoas na fila de espera por uma vaga de leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) no Piauno, nesta sexta-feira (18), e a demora pode chegar a até quatro dias. Tempo que, infelizmente, para muitos, não dá para esperar.

A situação é frustrante para os profissionais da área da saúde. “A minha maior tristeza no momento não é que eu não consiga atender mais pacientes. O que me deixa mais preocupado e triste é saber que não sabemos quando isso vai passar. Estou envolvido com isso há um ano. Agora a pandemia piora e está tendo um resultado devastador, sem previsão de quando vai acabar”, explica Bruno Ribeiro, médico intensivista e conselheiro do Conselho Regional de Medicina (CRM). O médico atua há 16 anos como profissional da linha de frente em UTIs e disse que nunca viu uma situação de caos como existe hoje. “É desanimador não saber que momento as coisas vão acalmar e poderemos atender outras doenças. Quando percebemos que os casos, mortes e ocupação de UTI estão aumentando, parece que estamos enxugando gelo. Ver duas pessoas da mesma família internadas em estado grave no mesmo hospital, ou até mais, é frustrante. É claro que os casos de cura são animadores. Mas ver 90 pessoas numa fila esperando UTI dá uma sensação de que você não está conseguindo ajudar as pessoas como deveria”, acrescenta.

Bruno frisa que a capital, Teresina, não tem capacidade de receber todo mundo. “Antigamente, ano passado, as pessoas não passavam nem 24h na fila. Hoje elas passam até quatro ou cinco dias na fila. Se você reduzir o número de contaminação, também diminuiremos as filas. As medidas de isolamento social são muito necessárias nesse momento. Além de vacinar as pessoas, que é outra vantagem”, aponta.

Piauí precisaria dobrar o número de médicos intensivistas

Outro problema grave é a falta de médicos intensivistas no Brasil, o que não é diferente no Piauí. Para se ter ideia da dimensão do problema, existem apenas 50 profissionais com o diploma de intensivistas no Estado. “Esses profissionais são os que possuem diploma de especialista. Não é que todas as pessoas que trabalham com UTI no Piauí sejam esses 50 profissionais. Até porque, deste número, alguns não estão na ativa. Para se ter ideia, em São Raimundo Nonato e Bom Jesus não têm médicos intensivistas. Durante a pandemia, médicos de Teresina estão prestando atendimento para a equipe por mediação tecnológica. Mas o ideal era o profissional morando lá, acompanhando pessoalmente”, revela o médico intensivista Bruno Ribeiro.

O Piauí precisaria dobrar o número de profissionais especialistas. “O Piauí deveria ter, no mínimo, o dobro de especialistas para cuidar de todas as unidades que estão abrindo para a Covid-19. Deveríamos ter pelo menos 100 profissionais, para que o atendimento do interior tivesse a mesma capacidade do atendimento na capital. É praticamente como se nós tivéssemos que nos dividir em dois para dar conta do Estado. Por determinação da Anvisa, cada responsável dessa área só pode assinar por dois hospitais diferentes. Mas a Associação de Medicina Intensiva Brasileira, já entendendo a dificuldade, emitiu um documento autorizando que o profissional cuidasse de mais de duas. É uma carência grande”, constata o médico.

O mercado precisa de novos profissionais. “É uma especialidade nova. Não faz muito tempo que existe essa especialidade. Além disso, exige muitos plantões e situações muito tristes. Não temos uma solução a curto prazo. Não dá para dizer que em abril teremos 10 médicos especializados nessa área. Mas essa especialização demora até quatro anos, então é algo que deve ser trabalhado a médio prazo. Agora temos duas especialidades no HGV e no Hospital Universitário. Por lei, a unidade deve ter um profissional especialista para cada 10 pacientes, para orientar os demais plantonistas. Ainda assim, esse número 50 é bem baixo”, considera.

Equipe atende homem no chão em UPA de Teresina

Um caso que chegou à imprensa chocou os piauienses. Um homem morreu de parada cardíaca no chão da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Promorar, zona Sul de Teresina, por falta de estrutura. Poliana Santos, técnica de enfermagem que atendeu o senhor, faz um apelo: “se puder ficar em casa, fica em casa”.

A equipe trabalhou como pôde para tentar salvar a vida do homem. “Não tínhamos leito, não tínhamos monitor, não tínhamos ventilador. O que podíamos fazer, foi feito. A gente tá com essa falta de equipamentos não porque não tenha, mas é pela demanda alta. Consequentemente vai faltar, como está faltando. Fizemos mais de seis ciclos de reanimação cardiopulmonar e infelizmente não conseguimos trazer o paciente de volta”, afirma Poliana.

A profissional defende o isolamento social como medida preventiva. “A gente tá trabalhando assustado, com medo. Na verdade eu queria até fazer um pedido, do fundo do coração. Gente, se puder ficar em casa, fica em casa. Se não foi uma saída essencial, fica em casa. Por mim, que sou profissional de saúde; pelos meus amigos que estão sofrendo, com os pacientes e com a família. É difícil para quem está vivendo e acompanhando. É doloroso. Não vamos esperar chegar dentro da sua casa para você entender que não são números, são vidas. E vidas são sempre o amor de alguém. E a gente perder que a gente gosta dói. O sistema de saúde está colapsado. Eu faço um apelo a vocês. Evite sair pela sua mãe, pelo seu pai e vizinho. Não temos leitos. Nós profissionais da saúde estamos sofrendo. Esse apelo fica na esperança de ser atendido”, finaliza.

 

mn