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fumoO tabaco de enrolar deixou de ser "caipira", ganhando um caráter "moderninho". Se antes era típico da área rural, agora conquista cada vez mais adeptos no meio urbano.

De acordo com a última pesquisa do Ministério da Saúde e do INCA (Instituto Nacional do Câncer) sobre o tema, divulgado em 2011, o consumo de tabaco solto abrangia 5,1% da população e de cigarro industrilizado, 14,4%. O consumo de tabaco solto na área rural era de 13,8% e na área urbana, 3,6%.

No entanto, o pneumologista Paulo Corrêa, da Comissão Científica de Tabagismo da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), afirma que esse cenário mudou. "O uso do tabaco enrolado à mão se disseminou. Não se restringe ao meio rural, é da área urbana também", afirma.

Um dos pontos que faz com que o cigarro de enrolar conquiste mais adeptos é o ritual, que engloba o ato de escolher, comprar e enrolar o tabaco antes de fumar, segundo a psquiatra Renata de Azevedo, do Chefe do Departamento de Psicologia Médica e Psquiatria da Unicamp, com atuação na área de dependência química. Ela afirma que esse ritual pode dificultar ainda mais a decisão de parar de fumar.

"Os rituais são muito gostosos. O ritual preenche o tempo, relaxa e, às vezes, fica mais difícil de abandonar o próprio ritual do que a substância. Várias pessoas que param de fumar sentem tanta falta da nicotina quanto de tirar o cigarro do maço, acender, ver a fumaça. Quanto mais ritual, mais difícil de ficar sem", diz.

O cozinheiro Eduardo Ferreira, 21, de São Paulo, é uma das pessoas que trocaram o cigarro industrializado pelo tabaco de enrolar e valoriza o ritual. “Eu notei algumas diferenças. Sinto que é mais prazeroso por todo o ritual de preparação, de poder apagar e reacender quando quiser”, explica. Para ele, o fato de o tabaco durar mais tempo também é um atrativo.

Além de urbano, o tabaco de enrolar ganhou ares de modernidade. Isso se deve, segundo os especialistas, ao estilo de vida associada ao produto "vendida" pelos fabricantes.

Se nos anos 1980, as propagandas relacionavam o cigarro a uma vida de aventura, hoje os posts de tabacos de enrolar associam o produto ao estilo hipster - "moderninho".

"Apesar de haver lei que restrinja a propaganda de cigarros aos pontos de venda, a internet se tornou um meio de propagação, seja pelas redes sociais ou por meio de influencers", afirma o pneumologista.

A Hi Tobacco, da HBT, que se define como primeira empresa brasileira a vender o produto, utiliza as redes sociais para vender seu produto e sua ideia.

Quando criada, em 2011, a empresa tinha apenas um produto para oferecer ao mercado. Hoje, conta com duas marcas e quatro tipos de tabaco. O público consumidor é formado por jovens e adultos entre 20 e 40 anos, segundo a empresa. "A procura pelo tabaco para enrolar vem sendo cada vez maior no Brasil e o hábito já é muito popular na Europa", afirmou a empresa, por meio de sua assessoria de imprensa.

"Acho que esse glamour do tabaco de enrolar é muito mais um apelo para os adolescentes do que para os adultos, pois para eles o cigarro ainda tem seu charme, ainda é uma contravenção", afirma a psiquiatra. "Hoje existe uma discriminação social com o fumante. Temos levantamentos que indicam que a primeira razão para buscar tratamento para parar de fumar é a preocupação com a saúde, ou porque a pessoa já está doente, ou porque tem medo de ficar, mas, a segunda razão, é por mudanças no ambiente, seja no trabalho ou na família. Então, a pressão social exerce um impacto na decisão", completa.

Há um ano e meio o produtor de audiovisual Tiago Marconi, 36, dispensou o cigarro convencional e passou a consumir o tabaco solto. Com a mudança, a quantidade diária diminuiu. Se antes, fumava 20 cigarros por dia, hoje são cerca de cinco. “O cigarro artesanal demora um pouco para ser preparado, e é mais demorado para fumar, porque o conteúdo é mais denso e o papel queima de maneira mais lenta”, afirma.

Já para a jornalista Mariana Ribeiro, 29, a troca aconteceu por uma necessidade. Ela conta que fumava, no máximo, quatro cigarros por dia, mas começou a sentir que o organismo não estava reagindo bem e decidiu experimentar o tabaco de enrolar. "Troquei porque o cigarro comum estava me fazendo mal. Eu ficava enjoada, era como se meu corpo estivesse rejeitando o cigarro", conta. Atualmente, ela fuma dois cigarros de tabaco solto por dia.

Corrêa explica que um único cigarro artesanal equivale a três convencionais. Se uma pessoa fuma seis ou sete cigarros de enrolar por dia, é como se fumasse um maço inteiro do cigarro tradicional. “Essa equivalência se dá porque o cigarro artesanal é mais forte que o industrializado, possui mais alcatrão e nicotina. E, por não ter filtro, que diminui a emissão de fumaça, o consumidor inala mais esse vapor. Então, o tabaco de enrolar não é mais saudável. Pelo contrário, pode ser tão ou até mais nocivo do que o convencional”, afirma.

O pneumologista afirma que estudos mostram que pessoas que fazem uso do cigarro artesanal têm maior probabilidade de desenvolver Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), com quadros persistentes de enfisema pulmonar e bronquite, de maneira mais precoce que aqueles que fumam o cigarro convencional. Ainda não há dados que mostrem os efeitos do uso combinado de diferentes formas de tabaco — com cigarros convencionais, enrolados à mão, ou de palha, por exemplo.

Corrêa ressalta que tanto o cigarro industrializado quanto o artesanal contêm mais de 9.200 substâncias e que estudos mostram que quando a pessoa pára de fumar qualquer tipo de tabaco antes dos 35 anos não há redução na expectativa de vida. O pneumologista ainda explica que não há nenhum consumo de tabaco que seja considerado seguro.

O cigarro artesanal conta com a alternativa de uso de filtro. Segundo o médico, assim como no cigarro convencional, o filtro bloqueia apenas um grupo de todas as 9.200 substâncias, não diminuindo sua toxicidade.

 

R7

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