Com a rotina estressante e os desafios do dia a dia, é comum que muitas pessoas recorram a medicamentos para garantir uma boa noite de sono. No entanto, especialistas alertam que alguns remédios de venda livre podem esconder perigos.

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Um exemplo é o anti-histamínico Unisom, um indutor de sono vendido sem receita médica; contudo, seu princípio ativo — succinato de doxilamina — pode representar riscos à saúde cerebral.

Especialistas enfatizam que o uso frequente de anti-histamínicos de primeira geração está associado a um maior risco de desenvolvimento de demência. Um estudo recente, publicado no World Allergy Organization Journal, recomenda, inclusive, evitar o uso de medicamentos como o Benadryl, um exemplo clássico desse grupo.

Vale destacar que muitos desses remédios foram lançados ainda em 1946, antes de passarem pelos testes rigorosos de segurança que atualmente são exigidos, conforme aponta uma análise divulgada pelo Journal of Allergy and Clinical Immunology.

Essa é uma preocupação legítima entre os profissionais de saúde, como ressalta a médica internista Pamela Tambini. “Frequentemente, as pessoas acreditam que, por serem vendidos sem receita, esses medicamentos são inofensivos, mas o uso repetido ou prolongado pode prejudicar o raciocínio, provocar sonolência durante o dia e até causar problemas de saúde a longo prazo”, alerta.

Por que os anti-histamínicos de primeira geração podem afetar a saúde do cérebro Segundo a médica Seetha Bhagavatula, esses medicamentos atuam bloqueando a histamina, substância química liberada pelo sistema imunológico em resposta a alergias ou infecções. A histamina é responsável por sintomas como coriza, coceira nos olhos e irritações cutâneas. “Ao impedir a ação da histamina, os anti-histamínicos aliviam esses incômodos em todo o corpo”, explica a especialista.

Apesar de serem uma solução prática para alergias leves e sazonais, esses fármacos afetam mais do que apenas os sintomas alérgicos. Eles também induzem sonolência, o que justifica seu uso como auxílio para dormir.

Conforme detalha Tambini: “A histamina desempenha um papel importante na manutenção da vigília. Quando bloqueamos sua ação, ocorre uma sedação, o que explica seu uso em medicamentos para indução do sono”.

Contudo, pessoas com rinite alérgica que utilizam regularmente anti-histamínicos de primeira geração apresentam maior risco de desenvolver demência, segundo uma pesquisa publicada no Journal of Allergy and Clinical Immunology. O estudo também identificou um risco, embora menor, entre usuários de anti-histamínicos de segunda geração.

Isso acontece porque os anti-histamínicos mais antigos, como a difenidramina (ZzzQuil) e a doxilamina (Unisom), atravessam a barreira hematoencefálica, bloqueando receptores de histamina no cérebro.

Já os medicamentos de segunda geração foram projetados para minimizar esse efeito. No entanto, mesmo esses podem impactar a acetilcolina, um neurotransmissor essencial para memória, concentração e aprendizado. Por isso, o uso frequente desses remédios está associado a um risco maior de demência em pessoas idosas, como aponta uma pesquisa publicada no Journal of Alzheimer’s Disease.

“Se você interfere constantemente nesse sistema com medicamentos, seu cérebro pode não funcionar como deveria”, enfatiza Tambini. “Com o tempo, isso pode prejudicar a memória e contribuir para o declínio cognitivo, especialmente em quem já possui fatores de risco", explica.

Em idosos, além da confusão mental, esses medicamentos aumentam o risco de quedas. Mas, segundo a especialista, a maior preocupação está nos efeitos cumulativos sobre a saúde cerebral.

Exemplos de medicamentos com anti-histamínicos de primeira geração Para indução do sono: Unisom (succinato de doxilamina) Sominex (cloridrato de difenidramina) Tylenol Simply Sleep (cloridrato de difenidramina) ZzzQuil (cloridrato de difenidramina) Para tratar alergias: Benadryl (difenidramina) Chlor-Trimeton (clorfeniramina) Dramamine (dimenidrinato) Vicks NyQuil (succinato de doxilamina) Esses medicamentos não melhoram a qualidade do sono a longo prazo Se você já utilizou algum desses medicamentos para dormir, pode ter notado que eles ajudam a adormecer rapidamente, especialmente em noites de exaustão. No entanto, com o uso contínuo, é comum acordar no dia seguinte sentindo-se grogue ou mentalmente confuso, mesmo após várias horas de sono.

De acordo com Pamela Tambini, embora esses medicamentos possam ajudar a pegar no sono mais rapidamente, eles também podem comprometer a qualidade do descanso com o passar do tempo: “Esses fármacos reduzem a fase REM, uma etapa profunda e rica em sonhos, fundamental para a restauração do cérebro. Assim, embora você durma por várias horas, pode acordar sem a energia necessária, porque não alcançou a qualidade ideal de sono", pontua.

O que usar em vez de anti-histamínicos de primeira geração Mais importante do que encontrar um remédio para dormir é compreender a razão pela qual você sente necessidade dele, especialmente se houver condições de saúde subjacentes que possam intensificar os efeitos colaterais, orienta Bhagavatula. Seja estresse, hábitos inadequados de sono, efeitos adversos de outros medicamentos ou insônia, identificar a causa é fundamental.

“O sono é um processo complexo e, embora soluções rápidas sejam tentadoras, elas podem causar mais prejuízos do que benefícios. “Existem alternativas mais seguras e eficazes, e buscar orientação médica é o primeiro passo para entender o que realmente está prejudicando seu sono", adverte Tambini.

Ainda assim, ela esclarece que não há problema em usar medicamentos como Unisom ou ZzzQuil ocasionalmente. “Tomá-los por uma ou duas noites pode ser útil para situações temporárias, como jet lag ou estresse antes de um evento importante”, afirma. “Mas, ao desenvolver tolerância — o que pode ocorrer após uma ou duas semanas de uso regular —, esses medicamentos deixam de surtir efeito e o organismo passa a depender deles, sem que a causa real da insônia seja tratada", continua.

A longo prazo, tanto a Dra. Tambini quanto a Dra. Bhagavatula recomendam buscar soluções que preservem a saúde cerebral, como:

Para dormir: Alternativas ao

ZzzQuil

incluem suplementos como melatonina e raiz de valeriana, que algumas pessoas consideram eficazes.

Para quem enfrenta dificuldades persistentes para dormir, ambas as especialistas recomendam a terapia cognitivo-comportamental para insônia, considerada o tratamento mais eficaz.

De acordo com uma pesquisa publicada na Clinical Psychology and Special Education, essa abordagem ajuda a melhorar os hábitos de sono e a reeducar o cérebro para dormir melhor. No entanto, esse tratamento exige várias sessões e não oferece a solução imediata que produtos como a melatonina proporcionam.

Para alergias: Quando o objetivo é tratar

alergias

, não é necessário colocar a saúde cerebral em risco.

“Anti-histamínicos de segunda geração, como Claritin, Zyrtec e Allegra, atravessam menos a barreira hematoencefálica, evitando a sensação de sonolência e confusão”, afirma Tambini. “Para quem sofre com alergias, essas são opções muito melhores, especialmente para uso diário.”

Além disso, os sprays nasais esteroides, que não pertencem à classe dos anti-histamínicos, são a escolha mais indicada para quem enfrenta alergias sazonais moderadas a graves.

ATENÇÃO: É essencial sempre consultar um médico antes de iniciar qualquer tratamento para dormir, mesmo com medicamentos de venda livre, principalmente se você já faz uso de outras substâncias que podem interagir e aumentar o risco de efeitos adversos.

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