R. É realista. Mas é preciso levar em conta que não se trata só de conseguir a vacina, mas sim de poder produzir milhões de doses. Só um país como a Espanha necessitaria de 100 milhões de vacinas, pois talvez sejam necessárias duas doses por pessoa, como acontece com a maioria de vacinas que conhecemos. Quem se vacinará antes? Talvez algumas pessoas não possam ter acesso a ela antes do final de 2021.
P. Qual vacina acha que chegará antes?
R. Há diferentes candidatos. Temos dois baseados em ácidos nucléicos nos EUA, uma de DNA [Inovio] e outra de RNA [Moderna]. Na Europa há uma de RNA e outra de vetor viral. Na China há uma de vetor viral e outra inativada, pelo menos. Eu acredito que a China será a primeira a ter a vacina, e provavelmente a consiga neste outono [boreal]. É minha sensação, porque o país iniciou o processo muito rapidamente e suas agências reguladoras não são menos estritas, mas têm formas de acelerar o processo de aprovação. As agências dos EUA e Europa talvez demorem mais, mas provavelmente estarão prontas no final de ano ou começo de 2021.
P. Todas as vacinas que estão sendo testadas em humanos fora da China têm o mesmo alvo: a proteína S do coronavírus que este usa para entrar nas células humanas É um risco apostar numa só tática?
R. A proteína S é um ótimo alvo, não há nada de mal no fato de quase todas as vacinas a usarem. Há outros formatos, como uma vacina viva atenuada, que está sendo desenvolvida, mas talvez demore mais. Isto seria um problema se entre todos os candidatos atuais se obtiver uma só vacina, porque nenhuma empresa tem a capacidade de produzir 16 bilhões de doses, que é a demanda global. Por isso é muito positivo que haja oito candidatos que já estejam sendo testados em humanos e outros 120 em desenvolvimento. Muitos destes últimos alcançarão também as fases de provas em humanos em alguns meses, com o que temos muitas opções para poder fazer vacinas locais ou pelo menos regionais. Poderíamos ter 10 vacinas diferentes que funcionam razoavelmente bem. Estamos em uma boa situação.
P. Poderíamos ter estado mais bem preparados para esta pandemia?
R. Sempre haverá vírus ignorados. Antes da recente epidemia de zika, ninguém se importava com este vírus. Há vírus relacionados com esse, como o spondweni e o usutu, que têm potencial de causar uma pandemia e que deveriam receber mais atenção e dinheiro. É possível que a partir de agora sejamos mais conscientes de que há um perigo real de que um vírus animal salte para humanos e gere um problema tão grave como o atual. Quem sabe despertemos para a realidade de uma vez.
P. Como poderíamos estar mais bem preparados para a próxima pandemia?
R. O razoável seria ter uma estratégia baseada em vigiar os vírus presentes em animais e, se você encontrar algo potencialmente perigoso, caracterizá-lo e fazer um candidato a vacina que pudesse desenvolver de forma muito rápida em caso de pandemia. Sempre há um problema de financiamento, mas este vírus ocasionou perdas tão brutais que investir uns poucos bilhões de euros não é tão grave.