Passos delicados e firmes, postura ereta, quadril encaixado e rosto levemente inclinado para cima. Pés considerados feios pela maioria das pessoas, no ballet é endeusado e vangloriado, item consideravelmente importante no processo de profissionalização, quanto maior o avanço, mais ‘judiado’ ele fica.
A idade ainda é pouca, mas a responsabilidade é muita para quem escolhe viver o mundo do ballet clássico como os pequenos, Anne Jullieth de 12 anos e Júlio Carlos de 9 anos. Eles já sabem que o caminho é árduo e que a persistência os leva além dos muros da Escola de Ballet Helly Batista, além dos muros de Teresina, e muito além dos muros do Piauí. Recentemente aprovados em uma seletiva do Youth America Grand Prix (YAGP), concurso que classifica apenas 50 alunos para todo o Brasil, os dois vão levar a sua dança para Nova York, e concorrer a bolsas de estudos para as melhores escolas dos Estados Unidos e da Europa.
“Esse ano eram apenas 30 vagas, do norte e nordeste apenas nós do Piauí e a Bahia passaram, a Anne participou pela terceira vez, e conseguiu se classificar, e o Júlio foi a primeira vez, apesar das dificuldades eles são muitos esforçados, e vão longe”, afirma Helly Junior professor e coreografo da Escola.
Anne e Júlio não são os únicos a ultrapassarem as fronteiras do Estado rumo a terras estrangeiras, o primeiro, Alef Albert, também participou do YAGP em Nova York, ele chegou a ganhar quatro bolsas para estudar ballet na Alemanha, Portugal, Canadá e Flórida. Além de Alef, Mara Barros e Ianca Passos seguiram essa trilha, pretendida por Anne e Júlio.
Castelo de sonhos
A Escola de Ballet nasceu do sonho do então bailarino Helly Batista, quando retornou a Teresina depois de estudar ballet clássico em São Paulo para onde foi ainda garoto. O ‘Tio Helly’ como era conhecido e tratado carinhosamente, usou sua influencia obtida na capital paulista e chegou a trazer com frequência para Teresina, grandes nomes da dança. Além de formar plateia Helly queria profissionalizar e exportar os talentos que aqui existiam.
Arquitetura da escola lembra a de um castelo, de fora já é possível ouvir clássicos da música erudita, usadas nos ensaios, crianças e adultos passeiam nos corredores e escadas vestindo a já tradicional roupa, collant geralmente preto, meia calça clara e sapatilha, o estado de conservação dá sinais do grau de elevação do bailarino, quanto mais velha, melhor. Apesar da rigidez dos professores durante as aulas, o ambiente é leve. É lá que muitos sonhos se realizam.
Com o tempo, e o relativo sucesso obtido com a escola, Helly pode realizar outro sonho, o Projeto Dançar para a Vida, dando oportunidade para jovens carentes conhecer a arte, que para muitos chegou a virar profissão. O projeto possibilita que cerca de 50 crianças estudem o ballet clássico de forma gratuita, foi o Dançar para a Vida que descobriu talentos como Mara e Alef, que moram fora do país, além de formar professores que atualmente trabalham na escola.
“Atualmente do corpo de dança da Escola apenas duas alunas são pagantes, sempre que tem alguma seletiva, nós ajudamos com alimentação, transporte, estadia, porque não podemos deixar esse sonho morrer, eles são muito esforçados, o Júlio mesmo pra estar aqui é muito difícil, ele mora no Jacinta Andrade, a Mara morava na zona rural de Teresina. São crianças carentes mesmo, e o dançar, não serve só para escola, dançar pra eles tem o poder de mudar seus destinos”, comenta.
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