Estima-se que no Brasil, pelo menos 2 milhões de habitantes possuam o espectro autista. Mesmo que seja uma condição que tenha se tornado relevante e bastante discutida no âmbito da educação e saúde, ainda há muita falta de conhecimento a respeito do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Ao observar a falta de assuntos acadêmicos relacionadas ao assunto, principalmente no estado do Piauí, o estudante do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, Renandro de Carvalho Reis, desenvolveu como projeto de doutorado a pesquisa: “Suporte Parental Associado com a Redução de Estereotipias em Crianças com Transtorno do Espectro do Autismo”, que por conta da sua relevância e contribuição chegou a ser publicada em revista internacional de medicina.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), e como indicada na introdução da pesquisa, o Transtorno do Espectro Autista (TEA) é definido como uma série de condições graves do neurodesenvolvimento definido por déficits sociais e de comunicação e comportamentos repetitivos ritualísticos que são tipicamente detectáveis na primeira infância. Tendo como consideração esse conceito, a pesquisa teve como principal objetivo investigar aspectos comportamentais de crianças com TEA e a relação entre o apoio parental e a redução da estereotipia em crianças com transtorno do espectro autista.
“Selecionamos 51 pacientes com transtorno do espectro autista, sendo 3 deles do nível 3 e os demais de tipo leve e moderado. Aplicamos três escalas: uma para avaliar a apatia, outra para avaliar o comportamento social e estimulado estereotipado, e uma terceira para avaliar os medicamentos que os pacientes estavam tomando. Foi utilizado também o Inventário de Comportamentos Sexuais da Criança (CSBI) e o questionário de ansiedade de Beck. Analisamos variáveis sociais e vimos o impacto do suporte de ambos os pais para o desenvolvimento social dos filhos com TEA”, explicou o doutorando Renandro de Carvalho.
Para o estudo clínico foram realizados dois métodos de investigação. O primeiro foi um estudo observacional sobre apatia e interação social entre crianças com TEA. O estudo ocorreu em um centro de reabilitação em uma cidade do nordeste brasileiro utilizando questionário de apatia e questionário Social Communication Questionnaire (SQC), além de um sociodemográfico. O segundo estudo foi uma intervenção com crianças e adolescentes que tinham sintomas de comportamentos sexuais aberrantes de hipermasturbação. Foi realizada intervenção em ensaio clínico aberto não controlado de 4 semanas com uso de fluoxetina na dose de 20 mg/dia para verificar eficácia na redução dos sintomas.
Os resultados da pesquisa revelaram que as crianças que usavam risperidona apresentavam uma pontuação maior na escala SCQ (p=0,049) e no domínio de comportamentos estereotipados (p=0,033). Já as crianças que não possuíam a presença dos pais casados apresentavam uma maior média de comportamentos estereotipados quando comparadas àquelas que possuíam pais casados (p=0,019). No segundo estudo foi identificado que a intervenção com fluoxetina foi eficaz na redução da pontuação média antes e após a intervenção nos comportamentos sexuais aberrantes de p=0,0002. 2
“Em nossa pesquisa pudemos observar aspectos comportamentais de crianças com TEA. Encontramos que crianças que cresciam sem a presença de ambos os pais possuíam um maior escore de comportamentos estereotipados. Outro aspecto comportamental nesse estudo foi o comportamento sexual aberrante e de hipersexualidade ao qual mostrou redução significativa com o uso da fluoxetina”, contou.
O trabalho foi publicado na revista internacional “Medicina”. O feito marca o estudo como a primeira pesquisa piauiense com a temática do espectro autista a ser publicada em uma revista internacional. Além disso, a revista faz parte da Molecular Diversity Preservation International e o Multidisciplinary Digital Publishing Institute (MDPI), pioneira na publicação de acesso aberto acadêmico, o MDPI apoia comunidades acadêmicas desde 1996.
A pesquisa também foi uma colaboração de Renandro com duas alunas da orientação de TCC. O orientador de Renandro e Médico, profº Kelson James, defende que a parceria é um modelo que rende frutos e aumenta a troca de conhecimento. “A Universidade por ser uma lugar amplo de troca de ideias e experiências, é um ambiente propício para a colaboração entre alunos de graduação e pós-graduação no desenvolvimento de pesquisas. Essa parceria permite que os alunos de graduação ganhem experiência prática na pesquisa, enquanto os alunos de pós-graduação têm a oportunidade de compartilhar seu conhecimento e orientação com os alunos mais novos”, argumentou.
O professor orientador também pontuou em como a descoberta vai poder ser referência para futuros tratamentos no Piauí e no Brasil. “No Brasil, não temos um número exato de habitantes que são TEA, o que existe são estimativas. Acreditamos que essa pesquisa é importante por ser a primeira publicação internacional sobre o tema no Piauí. Com mais pesquisas, poderemos entender melhor o transtorno e, com isso, desenvolver ferramentas e tratamentos para ajudar a melhorar a qualidade de vida dessas pessoas e de suas famílias”, declarou.
Por fim, Renandro destaca a participação do Programa de Pós-Graduação da UFPI no desenvolvimento da pesquisa e reforça a importância de mais estudos sobre o tema serem realizados. “O que se sabe de epidemiologia do TEA é baseado nos estudos de países desenvolvidos, principalmente os EUA. Não temos parâmetros sociais e econômicos para nossa realidade. É importante que haja estímulos financeiros para custear estudos como esse e no PPGCF pude efetivar a necessidade de fazer um estudo inédito e meu orientador, por ser médico, proporcionou a possibilidade e orientação adequada para um estudo clínico”, finalizou.
Ufpi