Um estudo inédito conduzido por pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Harvard e publicado nesta quarta-feira (1º) na revista Nature, mostra passo a passo como as bactérias conseguem romper proteções cerebrais e causar a meningite.
A meningite é uma inflamação das meninges, membranas que envolvem o cérebro e a medula espinhal. Ela pode ser causadas por diversos agentes infecciosos, incluindo bactérias.
Durante as investigações, feitas em camundongos, eles descobriram que as bactérias são capazes de suprimir respostas imunes das células nervosas das meninges, permitindo que a infecção se espalhe.
"Identificamos um eixo neuroimune nas fronteiras protetoras do cérebro que é sequestrado por bactérias para causar infecção – uma manobra inteligente que garante a sobrevivência bacteriana e leva à disseminação da doença", explica em comunicado o autor sênior do estudo, o professor de imunologia Isaac Chiu.
A meningite bacteriana em humanos tem como causa, na maioria das vezes, duas bactérias: Streptococcus pneumoniae e Streptococcus agalactia Ao chegar nas meninges, essas bactérias liberam uma toxina que ativa os neurônios da dor. Segundo os autores, isso explicaria a intensa dor de cabeça característica da meningite.
Os neurônios da dor ativados liberam uma substância química de sinalização chamada CGRP, que se liga a um receptor de célula imune chamado RAMP1.
Essa "tempestade" de substâncias químicas inunda os macrófagos, que são células de defesa responsáveis por detectar a presença de invasores – no caso, as bactérias –, atacá-las e destruí-las.
Os macrófagos também enviam pedidos de socorro para outras células do sistema imunológico para que haja uma segunda linha de defesa.
A liberação do CGRP e a ligação dele ao receptor RAMP1 presente nos macrófagos impede que essas células do sistema de defesa recrutem ajuda.
O resultado é que as bactérias se proliferam rapidamente e causam uma infecção na camada protetora do cérebro.
Os cientistas confirmaram que camundongos que não tinham o neurônio da dor ativado desenvolveram infecções cerebrais menos graves quando infectados pelas bactérias Streptococcus pneumoniae e Streptococcus agalactiae.
As meninges deles tinham altos níveis de células imunológicas capazes de combater a infecção.
Já os camundongos que tinham o neurônio da dor intacto apresentaram baixa resposta imune e níveis elevados de bactérias.
Potenciais tratamentos
Os pesquisadores fizeram outro experimento em que usaram uma substância química para bloquear o receptor RAMP1 e impedi-lo de se comunicar com o CGRP, que é liberado pelo neurônio da dor ativado pelas bactérias.
Eles concluíram que o bloqueador de RAMP1 funcionou como prevenção, antes da infecção, e também como tratamento, após as bactérias já estarem nas meninges.
Os camundongos que receberam os bloqueadores de RAMP1 antes de serem expostos às bactérias apresentaram uma presença bacteriana reduzida nas meninges.
Os que tomaram depois da infecção tiveram sintomas mais leves e foram mais capazes de eliminar as bactérias, em comparação com os animais não tratados.
O estudo abre caminho para que no futuro haja um medicamento capaz de frear a meningite antes que ela evolua para quadros graves.
Segundo o artigo, os compostos que bloqueiam o CGRP e o RAMP1 são encontrados em uma série de medicamentos usados para tratar enxaqueca e poderiam se tonar a base de novos fármacos para a meningite.
"Qualquer coisa que encontrarmos que possa afetar o tratamento da meningite durante os estágios iniciais da infecção, antes que a doença se agrave e se espalhe, pode ser útil para diminuir a mortalidade ou minimizar os danos subsequentes", complementa Felipe Pinho-Ribeiro, que também assina o artigo.
R7
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