Pessoas que tiveram um quadro leve de Covid-19, mas passaram a enfrentar ansiedade e depressão meses após a doença, podem ter alterações cerebrais que afetam diretamente a função e a estrutura do cérebro — o que compromete a memória, por exemplo.
Os dados são de um estudo brasileiro divulgado recentemente, financiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), que será apresentado na 75ª Reunião Anual da Academia Americana de Neurologia, em Boston. "Ainda há muito a aprender sobre a Covid longa, que inclui uma ampla gama de problemas de saúde, incluindo ansiedade e depressão, meses após a infecção", disse Clarissa Yasuda, PhD da Unicamp (Universidade de Campinas em São Paulo).
Ela acrescenta: "Nossas descobertas são preocupantes, pois mesmo pessoas com um caso leve de Covid-19 apresentam mudanças em seu cérebro meses depois".
O estudo reuniu 254 pessoas com idade média de 41 anos que passaram por uma infecção leve pelo coronavírus, em média, três meses antes. Por meio de testes, os cientistas avaliaram os sintomas de depressão e ansiedade em cada um.
No total, 102 voluntários apresentaram sinais das condições e 152, não.
Após essa avaliação, foram realizadas varreduras cerebrais em todos os participantes. Nessa fase, eles analisaram se havia danos à massa cinzenta do cérebro, para determinar se aconteceu um encolhimento da região.
Aqueles que tiveram ansiedade e depressão após a Covid-19 apresentaram encolhimento na área límbica do cérebro, também conhecida como cérebro emocional, que participa da memória e processamento emocional do ser humano.
Já os voluntários sem sintomas e sem diagnóstico recente de Covid-19 não tiveram encolhimento cerebral.
O estudo também usou um software especial para avaliar a função cerebral e as mudanças na forma como as áreas do cérebro se comunicavam. Foram analisadas 84 pessoas sem sintomas de ansiedade e depressão, 70 com sinais das condições e 90 sem diagnóstico recente de Covid-19.
Os cientistas descobriram que as pessoas que apresentavam sintomas de ansiedade e depressão tinham alterações funcionais generalizadas em todas as 12 redes cerebrais testadas. Já o grupo sem sintomas teve mudanças em apenas cinco.
"Nossos resultados sugerem um padrão severo de mudanças em como o cérebro se comunica, bem como em sua estrutura, principalmente em pessoas com ansiedade e depressão com síndrome de Covid longa, que afeta tantas pessoas", alertou Yasuda.
Por fim, a pesquisadora complementa que "a magnitude dessas mudanças sugere que elas podem levar a problemas de memória e habilidades de pensamento, por isso precisamos explorar tratamentos holísticos, mesmo para pessoas levemente afetadas pela Covid".
Os cientistas afirmam que uma das únicas limitações do estudo foi que os sintomas de ansiedade e depressão foram autorrelatados, então as pessoas podem tê-los julgado mal. Por isso, eles incentivam que mais estudos identifiquem tratamentos para prevenir quaisquer efeitos a longo prazo da Covid-19 na vida da população em geral.
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Foto: Reuters/Diego Vara