Há cerca de duas semanas, passei parte da manhã de sábado na emergência de um hospital. Um homem de cerca de 50 anos movimentava-se com dificuldade – seria infecção urinária ou problema renal? – e foi atendido antes de mim. Quando eu estava conversando com a médica, o urologista para o qual o paciente tinha sido encaminhado bateu na porta para avisar à colega que o desconforto havia sido causado por um comprimido para disfunção erétil. Detalhe: o homem havia omitido a informação na consulta. Pelo visto, não está sozinho. Pesquisa realizada por cientistas de diversas universidades, entre elas as de Utah, Michigan e Iowa, nos Estados Unidos, mostrou que entre 60% e 80% das pessoas não dizem toda a verdade para seus médicos.
Com que frequência você tem se exercitado? Sua dieta alimentar é balanceada? Qual é o seu consumo semanal de bebida alcoólica? Essas são perguntas que costumam desafiar a honestidade dos pacientes. Entre os entrevistados, pelo menos um terço respondeu que mentia quando não concorda com as recomendações médicas. Quase todos argumentavam que evitavam ser julgados ou receber um sermão, mas metade dizia que simplesmente tinha vergonha de falar a verdade. Para a psicóloga Angela Fagerlin, uma das coordenadoras do estudo, a maioria das pessoas quer que seus médicos as tenham em alta conta: “os pacientes temem ser vistos como incapazes de tomar decisões acertadas”, explicou.
As conclusões foram resultado de duas pesquisas on-line: a primeira, com 2 mil participantes com cerca de 36 anos; a segunda com quase 2.500 entrevistados de 61 anos. Todos eram apresentados a sete situações nas quais é comum o paciente ficar inclinado a esconder hábitos e comportamentos de seu clínico. Depois, deveriam selecionar quais já haviam acontecido com eles e explicar por que haviam decidido faltar com a verdade. Para a professora Andrea Gurmankin Levy, o risco é considerável: “o paciente que sonega informações sobre o que come ou medicamentos que toma pode provocar consequências desfavoráveis para sua saúde, principalmente se tiver doenças crônicas”.
Para as duas pesquisadoras, que pretendem ampliar o estudo com entrevistas logo após as consultas, de modo que as pessoas contem detalhes sobre os motivos que as levaram a mentir, os médicos devem encarar isso como um alerta. “A forma como se relacionam com seus pacientes pode ser causa de eles hesitarem em se abrir, o que nos leva a outra questão: o que os profissionais devem fazer para seus pacientes se sentirem à vontade para falar?”, questionou Angela Fagerlin.
G1
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