Praça da Estação, Região Central de Belo Horizonte. Enquanto passageiros apressados saem da estação de metrô e atravessam a Avenida dos Andradas para começarem a rotina de trabalho, Robenilton Barreiros dos Santos já perdeu a noção de dia e horário, e só não se esquece do caminho do bar, onde habitualmente busca “a branquinha” para “levar a vida”.
O álcool mata, todos os anos, 3,3 milhões de pessoas em todo o mundo, número que representa 5,9% das mortes. Os dados, da Organização Mundial da Saúde (OMS), mostram que o consumo da bebida chegou a 8,9 litros por pessoa no Brasil em 2016, superando a média internacional, que era de 6,4 litros.
Por trás dos olhos marcados pelas rugas, dentes amarelados e cabelos grisalhos, ele esconde a verdadeira idade. Apenas 39 anos. “Acho que são umas sete da manhã, né. Eu bebo tanto que fico confuso. Tenho família, casa, mas larguei de mão. Pareço velho, mas não sou não. A bebida faz isso com a gente. Leva tudo de bom embora”, disse.
Do outro lado da capital, na Regional Nordeste, uma dona de casa de 42 anos sofre com o mesmo problema. “Eu comecei a beber com uns treze anos de idade, por causa de algumas amizades. Na época, era muito bom. Há sete anos eu comecei com a cachaça e estou assim até hoje. Eu já entrei em coma alcóolico, tive delírios, fiquei internada em vários hospitais. Eu preciso parar com isso, mas não sei se consigo. Sei lá. Um dia eu ainda vou parar”, contou.
O psiquiatra e coordenador do Centro de Referência em Drogas (CRR) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Frederico Garcia, explica que o álcool é uma doença do cérebro, e que deixa várias marcas no organismo.
“A primeira marca está ligada com liberação de dopamina, substância que dá a sensação de prazer. Ou seja, com o passar do tempo o cérebro passa a associar os bons momentos com a bebida, e a partir daí o sujeito entende que só dá para ter prazer com o consumo da substância”, disse.
Como uma segunda consequência grave, o médico explica que o álcool é convertido no fígado para uma substância chamada aldeído. Essa substância tóxica é a responsável por problemas de saúde provocados pelo álcool, como a cirrose.
Cristiano de Oliveira Nascimento tem 32 anos e começou a beber aos quinze. Ele conta que, quando mais novo, consumia bebidas mais caras, como uísque e vodca. Com o tempo e a dependência da bebida alcoólica, essa realidade mudou.
“Hoje, eu não tenho mais trabalho e nem dinheiro para beber coisas caras. Aí, eu acabo tomando a cachaça mesmo. Em qualquer boteco a gente compra uma barrigudinha por dois, três reais. Eu bebo todos os dias, então tem que ser a mais barata mesmo”, disse.
Além de perder o trabalho, ele ainda carrega prejuízos na saúde e no convívio familiar. “Eu caio muito, não tenho mais firmeza nas pernas. Tomo remédio para cuidar da pressão e para conseguir dormir. Mas o pior não é isso. O pior é que eu perdi várias pessoas na minha vida, vários parentes. Eu peço perdão a todos, porque eu ainda quero mudar. Isso que eu passo não é vida pra ninguém não”, lamentou.
Para Frederico Garcia, a grande dificuldade de alertar a sociedade sobre os riscos da bebida alcóolica, é que nem todas as pessoas serão dependentes. Além disso, ele pondera que o consumo do álcool é socialmente aceitável, e que por isso os dependentes têm dificuldades de entender que precisam de ajuda.
“Entre as pessoas que experimentarem uma droga, cerca de 10 a 15% ficarão dependentes, ou seja, não é a maioria. Mas, é preciso tratar a situação como um problema de saúde e que precisa ser solucionado”, pontou.
Além da dependência, que gera danos graves para o usuário, o álcool é associado a mais de 130 doenças, e é um fator de risco importante para doenças como diabetes, hipertensão, problemas cardíacos, câncer.
De gole em gole
Veja abaixo os efeitos do álcool em crianças e adolescentes, mulheres e idosos:
Crianças e Adolescentes
Consumo antes dos 16 anos aumenta significativamente o risco de beber em excesso na idade adulta;
Sequelas neuroquímicas, emocionais, déficit de memória, perda de rendimento escolar, retardo no aprendizado e no desenvolvimento de habilidades, entre outros problemas;
Maior exposição a situações de violência sexual;
O alcoolismo entre 12 e 19 anos também eleva a chance de envolvimento acidentes de trânsito, homicídios, suicídios e incidentes com armas de fogo.
Mulheres
Mais vulneráveis aos efeitos do álcool devido a diferenças na composição biológica entre os gêneros;
Maior chance de ter problemas relacionados ao álcool com níveis de consumo mais baixos e/ou em idade mais precoce do que os homens;
Aumento do câncer de mama e de ovário
Idosos
Apresentam quadros de depressão, irritabilidade, confusão mental;
Sofrem deficiências nutricionais associadas ao uso crônico de álcool, que pode levar a quadros neurológicos e demenciais;
Maior risco de problemas cardiovasculares
A ingestão de álcool em idosos pode provocar efeitos mais acentuados se comparado aos jovens de mesmo sexo e peso.
G1
Fonte: Centro de Informações sobre Saúde e Álcool
Foto: Reprodução/TV Globo